Era Terça-Feira, 29 de Dezembro, eu estava há 3 dias na casa de uma Belga que conheci em Ulan Bator, capital da Mongólia, ela havia alugado um apartamento bem no centro da cidade, e me convidou para ficar por lá com mais dois franceses que também estão em uma longa viagem ao redor do mundo.
Eu havia comentado com os franceses que iria fazer trabalho voluntário em uma fazenda e eles também se interessaram, e através do site: workaway.info contactaram a mesma fazenda a qual eu iria ficar, e com prontidão também receberam um sim, dizendo que seriam bem vindos.
Sairiamos de Ulan Bator exatamente no dia 29 pela manhã, e fariamos uma viagem de trem, em direção ao Norte, quase na divisa com a Rússia (Sibéria), ou seja, os -25 graus diários não era frio suficiente, estavamos a caminho de um frio um pouco mais intenso.
Fomos para a estação, pegamos o trem, que nos custou algo em torno de R$ 13,50 e dividindo banco com alguns locais, estavamos a caminho desta nova experiencia.
O programa que escolhemos, é basicamente uma troca, onde você trabalha na fazenda, e recebe alimentação e acomodação como pagamento.
Não sabiamos exatamente o que iriamos fazer, mas estavamos todos prontos pro que desse e viesse.
Chegamos na cidade de Ohron as 7 da noite, os termometros marcavam -35 graus, e a estação estava praticamente sem ninguém, uma ou outra lampada acesa, e o trem partiu, deixando aquele clima de suspense, pois não sabiamos se iriam realmente nos pegar ali.
Com uns 3 minutos de espera, vi um rosto conhecido, um Sueco que eu havia conhecido em Ulan Bator, e que havia saido para a fazenda uma semana antes de mim, ele veio e nos avisou que o pequeno caminhão com o dono da fazenda estava atrás da estação.
Ao chegarmos no automovel, só tinha lugar para dois, portanto eu e os 2 franceses jogamos nossos mochilões na caçamba e pulamos lá também. Com o carro em movimento não consigo descrever o frio que fazia, mas posso afirmar que foram os 15 minutos mais gelados que já passei até hoje.
O dono da fazenda se chama Martin, ele é Australiano, deve ter quase 70 anos, e há quase 20 anos é casado com a Minjeen, Mongol que tem seus trinta e poucos anos, juntos eles gerenciam esse pequeno sitio no interior da Mongólia, onde possuem alguns cavalos, bodes, ovelhas, vacas, e durante o periodo que não está tão frio, cultivam vegetais.
O Martin é aquele senhor casca grossa, super sem paciência e logo de inicio desceu do carro, deu as costas para nós todos e não falou absolutamente nada, entrou na casa, e foi para a sala de jantar, onde tem uma mesa para 10 lugares.
Fomos direcionados para o nosso quarto, para deixarmos as malas, mas sua esposa que nos acompanhou, pediu para retornarmos para onde o Martin estava, e assim fomos.
Quem me conhece sabe como sou comunicativo, gostou de um bom papo e faço brincadeiras sempre que possível, mas as primeiras palavras que ouvimos vindas do dono da fazenda foram:
- Voces começam a trabalhar amanha as 4:30 da manha;
- O trabalho é tirar as vacas do curral; limpar o local; dar comida para todos os animais; levar as ovelhas e bodes para uma caminhada das 11 da manha as 4 da tarde (cada dia um voluntário diferente); juntar todas as fezes dos animais em lugares pré definidos por mim; carregar o caminhão com essas fezes; descarregar o caminhão; limpar o patio central onde os animais ficam parte do dia; separar as vacas leiteiras; alimentar mais uma vez os animais; colocar os animais em seus devidos lugares; lavar todas as louças utilizadas na cozinha (um voluntário responsável a cada 3 dias trabalho);
- Tudo que a Minjeen mandar vocês fazerem vocês obedecem, e tudo que eu mandar ela fazer ela me obedece, pois eu mando em tudo e em todos;
- Se vocês não estiverem satisfeitos com alguma coisa que falei, a porta está sempre aberta, vocês não são bem vindo aqui, e estão previamente convidados a irem embora!
E esse foi o: Bem vindo a fazenda, que tivemos.
Além do sueco, haviam mais dois franceses que já estavam por lá há 10 dias, ou seja era eu de brasileiro, um sueco e 4 franceses.
O banheiro era fora da casa, com apenas o buraco no chão da privada, e não havia local para banho, eles só tomam banho no verão, portanto não existia nenhum lugar para se banhar.
Os meninos que já estavam na fazenda há 10 e 7 dias, estavam todo esse tempo sem banho, e o sueco que vai ficar 2 meses, já sabe que serao dois meses sem ver água no corpo.
No dia seguinte, fomos acordados as 8 da manha e nos informaram que aquele seria o horário oficial de acordar, e começamos entao as atividades diárias.
O trabalho é bem puxado, é 100% braçal e são basicamente 12 horas de trabalho por dia, onde o café da manhã é as 11, o almoço as 2 da tarde e o jantar as 8 da noite, após todo o trabalho estar realizado.
Não existe conexão de internet disponivel para os voluntários, nem mesmo telefone, portanto passei Ano Novo isolado do mundo, da família, amigos, sem saber o que aconteceu e sem falar com ninguém, apesar de tudo, foi bacana estar isolado de tudo que fui acostumado a viver nos ultimos anos de comemorações, seja no Brasil ou na Europa.
A media da temperature diária variava entre -25 e -40 graus, nosso trabalho era basicamente em areas abertas, entao foi bem puxado estar exposto ao frio extremo por tanto tempo, mas com o passar dos dias, seu corpo acaba de adaptando, e você começa a aproveitar um pouco mais, e ver que tudo na vida é questão de costume ou necessidade.
Meu irmão é veterinário, e minha irmã está estudando para ser uma também, e o mundo deles é sempre relacionados a animais, além de entenderem sofre, eles gostam muito.
No meu caso, nunca tive um animal de estimação, e portanto nunca desprendi muito tempo com eles.
Os dias na fazenda me trouxeram momentos bem próximos de cavalos, vacas e demais bichos, o que foi muito bom. O que no inicio dava um pouco de medo, pois os animais são bem grandes, já no segundo dia me sentia em casa, e sem ter nenhum problema os dias rapidamente foram passando.
A experiencia em si foi bem positiva, a única coisa que não me agradou muito, foi a forma em que o dono da fazenda tratava todas as pessoas ao seu redor, sempre diminuindo todos, falando muitos palavrões, e ainda por cima, se você falasse algo que ele não gostasse, ele mandava você fazer 5 apoios no chão, que eram acumulativos, ou seja, 5 agora, na proxima 10, depois 15, e assim por diante.
O momento com os outros voluntários também foi bem interessante, dois franceses são formados em TI e estão fazendo uma viagem de 1 ano, o Sueco está estudando pra trabalhar na NASA, e está em uma viagem de 1 ano também e os outros dois franceses que conheci na fazenda, estão há 3 meses na estrada, e vão fazer uma viagem de 1 ano e meio, estão començando a descer em direçao a Oceania, ainda tem muito chão pela frente.
Fiquei 6 dias na fazenda, e juntamente com os dois franceses com quem fui, voltei para Ulan Bator, para dar continuidade a minha programação.
Foi tudo muito corrido, não tive muito tempo ainda de parar pra analisar como foi esta ultima semana, mas posso dizer que vale a pena sair da rotina, e entrar em um mundo que é tão diferente do seu de forma tão intensa.
Acredito ter dado uma renovada nas energias e agora sei que estou pronto pra começar 2016 de forma 100% diferente de todas as outros anos que comecei.