Numa conversa informal com um amigo, ele comentou de um trem que atravessava a Rússia de Leste a Oeste e se chamava Trans-Siberiano, pois passava pelo meio da Sibéria, e falou também que era a maior malha ferroviária do mundo.
Sabe quando palavras entram pelo seu ouvido, e vão diretamente para aquela lista: “coisas que farei em breve!!!”, poisé, foi exatamente isso que aconteceu.
Eu NUNCA havia escutado falar dessa rota, e dediquei absurdamente horas e mais horas assistindo videos no youtube, lendo materias em blogs e entendendo o que era essa rota do Trans-Siberiano.
Uma coisa que descobri, foi que grande parte dos viajantes, ao invés de atravessar a Rússia, ao chegar na Sibéria, especificamente numa cidade chamada Ulan-Ude, eles desciam para a Mongólia, passando pela capital Ulaanbaatar, e entrando pelo norte da China em direção a Pequim, capital da China. Esta rota tem um outro nome, se chama Trans-Mongoliano.
Muitos optam por esta opção, pois acaba agregrando mais para a viagem, passando por 3 super interessantes países: Rússia, Mongólia e China.
Eu fiquei mais confuso ainda, pois queria conhecer tudo.
Bem, anos se passaram desde quando ouvi falar desta rota, mas ela nunca saiu dos meus sonhos.
Quando sai para minha viagem ao redor do Mundo, decidi que incluiria essa jornada de trem no meu roteiro, mas faria o caminho contrario, saindo da China, indo norte para a Mongólia e então chegaria na Sibéria de onde iria viajar oeste, em direção a Moscow.
Felizmente, eu mal sabia que meus planos não sairiam como planejado!
Nesta materia vou falar mais das experiencias em relação aos trens, valores, cidades que parei, e qualquer informação adicional que achar interessante colocar, caso alguém tenha alguma duvida que não foi esclarecida, meu email estará no final do post, ou também poderá comentar aqui nesta materia, e eu terei um grande prazer em responde-los assim que possível.
Bem cheguei na China, após uma curta temporada de volta a Europa, e depois de quase um mês viajando pela parte central do país, eu tinha que sair dali, pois meu visto estaria vencendo dentro de dois dias.
Eu sabia que meu próximo destino seria Ulaanbaatar, capital da Mongólia, e nas pesquisas que eu havia feito, achei o ticket pelo trem oficial do Trans-Mongoliano, saindo de Pequim por 330 doláres.
Eu achei caro, mas eu nao teria escolha, peguei o dinheiro e fui pra estação.
Cheguei lá tudo estava lotado.
Eu teria que sair naquele mesmo dia, e para reservar esse trem, tem que ser com pelo menos 20 dias de antecedencia, ou seja, seria impossivel conseguir o ticket que eu queria.
Fiquei médio desesperado, pois cogitei a possibilidade de ter que comprar um voo pra Mongólia, e não seria o que eu queria, pois queria ter essa experiencia por terra.
Voltei rapidamente para o hostel que eu estava, e comecei a pesquisar outras possibilidades.
Achei um blog de um rapaz que teve o mesmo problema que eu, e teve que sair da China de um dia pro outro.
Ele comentou que ao invés de usar o trem oficial da rota, ele optou pelo trem normal, onde pessoas locais viajam, fazendo mesmo percurso que os trens oficiais.
Foi quando tudo se encaixou, pois eu nao queria muito contato com turistas, e sim com os moradores locais de cada país ao qual eu atravessaria.
A única questão desse trem local, é que eu teria que montar meu roteiro e escalas, ou seja, ver quais sao as cidades no caminho, e comprar os tickes e suas respectivas paradas.
Ainda no hostel, analisei o mapa e fiz a seguinte escolha de rota:
De Pequim, eu pegaria um trem para Jining South, também na China, onde eu desceria e esperaria por 4 horas, e pegaria um outro trem para Earlian, cidade que faz fronteira entre China e Mongólia.
Lá eu desceria do trem, teria que achar um local para dormir, no dia seguinte atravessar a fronteira e ir para a próxima cidade chamada Dzanyn Ude, já na Mongólia, onde eu pegaria um outro trem para a capital Ulaanbaatar.
Esta parada em Dzanun Ude seria de 16 horas.
Não pensei duas vezes, sai do hostel direto pra estação de trem, levei todos os nomes de cidades que precisava, juntamente com horarios e numeros dos trens.
Ao chegar lá me informaram que não poderiam me vender o ticket de Dzanyn Ude para Ulaanbaatar, pois fazia parte da empresa na Mongólia, me informaram que eu poderia comprar os trechos Pequim – Jining South, que me custaria 10 euros, na terceira classe onde eu ficaria acomodado num quarto com duas beliches mas que não teria porta, ou seja, o vagão todo era aberto, com alas contendo duas beliches (4 camas).
De lá, a única opção que eu tinha seria Jining South – Earlian por 5 euros, mas eu teria que ir em pé, em uma viagem de 6 horas, pois não tinha mais lugar disponivel.
Eu não pensei duas vezes, e por 15 euros, comprei tickets em dois trens, que me levariam até a fronteira com a Mongólia.
Voltei para o meu hostel, arrumei minhas malas, e aguardei até as 2 da manha, horario que meu trem deixaria a capital chinesa.
Foi uma viagem super tranquila, pela manha eu estava em Jining South.
Ao chegar na estação fui direto para o meu portão de embarque, aguardei por algumas horas e peguei o próximo trem para Earlian.
Ao entrar no trem, era perceptivel que eu era o único não Chinês.
Com uma mochila gigante nas costas e uma pequena na frente, atravessei todo o vagão e fui para um espaço que fica próximo ao banheiro, onde eu teria que ficar em pé.
Não havia passado 2 minutos que eu estava naquele local, quando um sorridente senhor chines, me agarrou pelo braço, e me colocou em sua poltrona, imediatamente ele abriu espaço entre os dois rapazes que sentavam em frente ao meu novo local, e juntos, os 3 senhores ali ficaram.
Coloquei todas as palavras que eu havia aprendido em Chines numa unica frase, e agradeci ao extremo por aquela gentileza.
Não achando muito, abriram sacolas, e tiraram comida, água, chá, doces, frutas e me fizeram sentir em casa.
Em poucos minutos haviam dezenas de pessoas em pé, ao meu redor, tirando foto, falando comigo bem devagar, como se aquilo fizesse com que o chines fosse mais facil de ser compreendido. Mesmo sem nenhuma comunicação, me senti extremamente bem acolhido por aquelas dezenas de pessoas.
Foram horas de muitas gargalhadas e diversão com aquele povo tão acolhedor e simpatico. A China com certeza tem um dos povos mais hospitaleiros que eu já tive a oportunidade de conhecer.
Cheguei em Earlian, era inicio da noite, mas por ser inverno já estava escuro desde o meio da tarde.
O termometro na estação marcava -23 graus, eu tinha então que andar até achar um local pra dormir.
Sai pela porta principal da estação, me desviei dos taxistas que rapidamente vieram me oferecer seus serviços, e eu tinha duas opções, andar para a esquerda ou para a direita, optei pela direita, e dentro de pouco mais de 5 minutos, escutei uma voz fraca gritando “Hotel, Hotel!!!”.
Olhei pra minha esquerda, e vi uma senhora com roupas tipicas, que sorridente abriu a porta de onde estava e falou: “Hotel, welcome!”.
Fui até lá e perguntei pelo preço, ela me falou que eram 10 euros, e pediu para que eu fosse ver o quarto. Eu disse que não precisava, mas que gostaria de ter acesso a internet, ela disse que tinha wi-fi e água quente, que eu não teria problemas.
Ali mesmo já paguei, e subi para o meu quarto.
Da janela da minha acomodacao, dava pra ver a estação que eu havia descido.
Deixei as malas e sem ver o quarto sai para comer algo, eu estava faminto.
Achei um restaurante simples mas com comida boa e barata bem próximo do hotel, e lá tive o meu jantar.
Voltei pra acomodacao, o quarto e o banheiro estavam bem sujos, mas minha cama estava limpinha e a água para banho era quente. Esses dois fatores preenchiam todos os quesitos do que eu precisava naquele momento.
Tomei um banho demorado, falei com minha família e literalmente apaguei.
Dia seguinte, voltei no mesmo restaurante, pedi o mesmo que eu havia comido no jantar do dia anterior e após me alimentar, decidi que atravessaria a fronteira China/Mongólia andando.
Comecei a caminhada e um taxista me falou que de onde eu estava seriam uns 5km até a fronteira, e que ele me levaria por 2 euros. Eu poderia ter andado, mas tava bem frio e eu tava sem muita disposicao naquele momento, acabei aceitando e ele me deixou na fronteira.
Peguei minhas mochilas, quando tentei atravessar, os policiais me falaram que eu não podia atravessar andando, teria que achar um carro ou onibus e fazer a travessia desta forma.
Todos os carros que passavam por mim naquele local, estavam abarrotados de coisas e completamente lotados. Impossivel de pegar uma carona.
Aguardei por duas horas, até que um onibus parou, perguntei quanto era a travessia, eles falaram que me custaria 2 euros, não pensei duas vezes, e entrei no onibus.
Foram 200m de travessia, passei pelo check point da China, aquele era o meu ultimo dia no país, e entrei na Mongólia, onde peguei 30 dias de visto de turista, e não paguei nada, o visto era FREE para brasileiros.
Já pisando em terras Mongolianas, me informei que a cidade de Dzanun Ude estava a 5 km dali, a qual eu conseguia ver da estação que estava, decidi que caminharia até lá, calculei que com aquela neve eu faria em uma hora e meia.
Quando comecei a andar, varias pessoas me seguraram pelo braço e falaram para esperar ao lado deles, que um onibus me levaria até a cidade.
Esperei uns 15 minutos, o onibus chegou, paguei menos de 1 euro, e ele me levou até o centro, que era exatamente na entrada da estacao.
De Dzanun Ude para Ulaanbaatar seriam 14 horas de trem, eu estava super cansado, com todo esse vai e nao vai, para sair da China, e optei por pegar a segunda classe no trem, onde era um quarto com 1 beliche e uma cama normal, num vagao mais confortavel, que tinha quartos com porta, paguei 17 euros pelo ticket.
Se você pegar um mapa e olhar o que tem entre Dzanun Ude e Ulaanbaatar, vai entender que basicamente não existe nada, somente um gigante deserto, chamado Gobi, é um dos maiores e menos explorados do mundo, e no inverno fica completamente coberto de neve.
Pois lá fui eu, tentando ver algo diferente da janela do trem, e por horas nada mudava, apenas neve numa imensidão sem fim.
Existem pequenas vilas nas margens da malha ferroviaria, e normalmente estas vilas são pontos de parada do trem, e quando paravamos, dava pra ver a temperatura do lado de fora, a qual estava bem próxima dos 40 graus negativos, algo surreal.
Pensei em sair do trem pra respirar um ar fresco, mas teria que colocar calça, bota, optei por ficar ali dentro do trem, e aproveitar que tava tudo quentinho.
Fui pra minha cama e apaguei.
No meu sonho, uma mão não parava de mexer comigo, eu fiquei sem entender.
Não queria entender, portanto continuei tentando sonhar, foi quando a senhora que trabalhava no trem, me deu uma saculejada mais forte e acordei, ela mostrou o relógio, e disse que chegariamos em 30 minutos.
Eu sabia que não tinha lógica aquela mão no meu sonho.
Acordei meio desorientado, fui ao banheiro, escovei os dentes, lavei o rosto, comi algo, coloquei minha roupa pra neve e arrumei minhas malas. Estava pronto.
O trem parou, quando eu desci, em menos de 30 segundos eu entendi o porque Ulaanbaatar é considerada a capital mais gelada do mundo.
Estava algo em torno de -35 graus, nunca vi tanta fumaça sair da minha boca.
Eu não havia reservado acomodação, mas havia pego alguns nomes.
Joguei num mapa offline que eu tenho, e vi que chegaria neste hostel após uma hora andando pela cidade.
Pensei em pegar um taxi, mas eu queria andar e já ir me familiarizando com as ruas, pessoas e com a cidade de um modo geral.